A IGREJA CATÓLICA E O ESPIRITISMO



Já vimos nos capítulos precedentes numerosos pronunciamentos oficiais da Igreja católica com relação às práticas e doutrinas espiritistas. Falta ainda a exposição mais sistemática de dois pontos: 

1. O ESPÍRITA PERANTE A IGREJA
Em 1953 a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil reafirmou a determinação feita pelo Episcopado Nacional na Pastoral Coletiva de 1915, revista pelos bispos em 1948 nestes termos: - "Os espíritas devem ser tratados, tanto no foro interno como no foro externo, como verdadeiros hereges e fautores de heresias, e" não podem ser admitidos à recepção dos sacramentos, sem que antes reparem os escândalos dados, abjurem o espiritismo e façam a profissão de fé".
Segundo o novo Direito Canônico (de 1983), "chama-se heresia a negação pertinaz, após a recepção do batismo, de qualquer verdade que se deve crer com fé divina e católica, ou a dúvida pertinaz a respeito dela" (cân. 751). E no cânon 1364 § 1, a nova legislação eclesiástica determina que "o herege incorre automaticamente em excomunhão", isto é: deve ser excluído da recepção dos sacramentos (cân. 1331 § 1), não pode ser padrinho de batismo (cân. 874), nem da confirmação (cân. 892) e não lbe será lícito receber o sacramento do matrimônio sem licença especial do bispo (cân. 1071) e sem as condições indicadas pelo cânon 1125. Também não pode ser membro de associação ou irmandade católica (cân. 316).
Já vimos nas páginas 26-32, ao expor as linhas gerais da doutrina espírita e cotejar este ensinamento com a doutrina cristã, que o espiritismo kardecista de fato nega quase todo o credo apostólico. E quando analisamos no capítulo IV a reencarnação, ficou claro que a palingenesia se opõe, em pontos essenciais, à pregação de Nosso Senhor Jesus Cristo, negando, principalmente, toda a soteriologia cristã. S, pois, evidente que o católico, quando adota a doutrina espírita, se enquadra perfeitamente na descrição que o citado cânon 751 faz da heresia, cometendo um "delito contra a religião", segundo a terminologia do novo Direito Eclesiástico, e incorre na penalidade prevista pelo cânon 1364 § 1. Ou, falando mais exatamente: o católico que resolve tornar-se espírita, por este fato, exclui-se a si mesmo da Igreja católica, perdendo
todos os direitos de católico.
Mas na prática pastoral a aplicação destas determinações jurídicas encontra a seguinte dificuldade: o vocábulo "espírita" é, de fato, entre nós, polivalente. Já AK observava em suas Obras póstumas (20f edição, pp. 367s.):
"O qualificativo de espírita, aplicado sucessivamente a todos os graus de crença, comporta uma infinidade de matizes, desde o da simples crença nas manifestações, até as mais altas deduções morais e filosóficas; desde aquele que, detendo-se na superfície, não vê nas manifestações mais do que um passatempo, até aquele que procura a concordância dos seus princípios com as leis universais e a aplicação dos mesmos princípios aos interesses gerais da humanidade; enfim, desde aquele que não vê nas manifestações senão um meio de exploração em proveito próprio, até o que haure delas elementos para seu próprio melhoramento moral. 
Dizer-se alguém espírita, mesmo espírita convicto, não indica, pois, de modo algum, a medida da crença; essa palavra exprime muito com relação a uns, e muito pouco, relativamente a outros.
Uma assembléia para a qual se convocassem todos os que se dizem espíritas apresentaria um amálgama de opiniões divergentes, que não poderiam assimilar-se reciprocamente, e nada de sério chegaria a realizar, sem falar dos interessados a suscitarem no seu seio as discussões a que ela abrisse ensejo".
Mas pondo de lado as ambigüidades, pode-se dizer que, segundo AK, "espírita" é todo espiritualista que admite a prática da evocação dos falecidos. Sobre esta base mínima podem construir-se os mais variados sistemas doutrinários. Assim são "espíritas" os adeptos do espiritismo anglo-saxão que não aceitam a doutrina da reencarnação, como são "espíritas" os seguidores de AK que fazem das idéias reencarnacionistas o ponto central de sua filosofia.  E porque os partidários da umbanda praticam assiduamente a evocação dos falecidos (e, aliás, endossam a doutrina da metensomatose), também eles são "espíritas" verdadeiros, no sentido original em que AK entendia o vocábulo por ele criado (cf. acima, p. 251).
E como não existe nenhum nexo necessário entre a prática da evocação dos falecidos e a doutrina da reencarnação, é perfeita mente imaginável que alguém aceite e pratique a necromancia sem admitir a palingenesia, como é igualmente concebível que alguém adote a filosofia da pluralidade das existências sem endossar a prática da evocação das almas dos que morreram. Mas a dimensão herética (isto é, negadora da doutrina de fé cristã) do espiritismo está principalmente na reencarnação. Pode-se admitir ainda que alguém professe sinceramente toda a doutrina cristã, tal como é proposta pela Igreja católica, e ao mesmo tempo julgue ser possível e lícito evocar os falecidos.
Já é evidente que nem todos, embora se digam ou sejam chamados "espíritas", podem ou devem ser considerados ou tratados da mesma maneira. Há evidente necessidade de distinguir:
1. Os que dirigem ou organizam o espiritismo (em qualquer de seus ramos) ou um centro espírita ou terreiro de umbanda e os que tomam parte ativa nas sessões (médiuns): são espíritas no sentido mais estrito do termo, valendo para eles a determinação do episcopado nacional:
"Devem ser tratados como hereges". Mas esta norma vale apenas para aqueles que antes eram ou diziam ser católicos. O mesmo não vale para os que já nasceram num ambiente espírita e nele foram educados. Os espíritas convictos e coerentes já não fazem batizar seus filhos, visto que, como lhes fez saber em 1952 o Conselho Federativo Nacional da Federação Espírita Brasileira, "o espiritismo é religião sem ritos, sem liturgia e sem sacramentos". Por conseguinte, já não são nem cristãos e devem ser considerados e tratados como os demais adeptos de religiões não-cristãs.
2. Os que se inscreveram como sócios em alguma entidade espírita. Os espíritas costumam controlar a fidelidade de seus sócios mediante caderneta individual, carimbada cada mês. O sócio que durante seis meses deixar de cumprir seus deveres de sócio é excluído. Segundo os Preceitos gerais publicados pela Federação Espírita Brasileira e válidos para todas as sociedades espíritas do Brasil, os sócios inscritos têm os seguintes deveres:
a) estudar a doutrina espírita (que aqui no Brasil é reencarnacionista); 
b) freqüentar regularmente as sessões de estudo da doutrina; 
c) pagar pontualmente suas contribuições pecuniárias. Deve-se, pois, supor que todo sócio de mais de seis meses não é apenas necromante, mas também reencarnacionista, e, como tal, herege, e assim há de ser tratado.
3. Os que, embora não inscritos, freqüentam habitualmente por mais de seis meses sessões para consultar os mortos, receber receitas ou passes etc. As assim chamadas "sessões públicas de estudo" são franqueadas a todos indistintamente. Mas toda sessão desta espécie é doutrinária: 
nela se ensina e administra a doutrina espírita (reencarnacionista). Por conseguinte, quem por mais de meio ano assiste habitualmente a tais sessões já não pode ser tido apenas como necromante, mas com razão é considerado adepto da doutrina reencarnacionista. Logo, é herege e deve ser tratado como tal.
4. Os que esporadicamente vão às sessões para consultar os falecidos, receber passes, receitas etc., levados, talvez, pela necessidade (doença, tristeza pela morte de alguém de sua família, situação embaraçosa) ou a convite insistente de amigos, vizinhos etc. Supondo que não vão por mera curiosidade, eles não são necessariamente reencamacionistas; são, todavia, necromantes ou "espíritas" no sentido lato do termo, tal como foi definido por AK. Se admitem a reencarnação, são sem dúvida hereges e como tais deverão ser tratados. . Se não aceitam a pluralidade das existências, mas apenas a prática da evocação, serão também hereges? A santa Sé declarou que este tipo de práticas inclui um "engano inteiramente ilícito e herético" (em latim: "deceptio omnino illicita et haereticalis", cf. Dz 1653 e 1654). Neste documento, de 1856 (naqueles anos começava na França a prática da evocação dos falecidos) a santa Sé repete duas
vezes ser pecado de heresia querer aplicar meios puramente naturais com o fim de obter efeitos não-naturais ou supranaturais. Por conseguinte, o espiritismo como evocação dos mortos, seja na forma de necromancia ou de magia, já é herético e, aliás, puro "engano". É preciso atender bem a este particular: tais práticas são rejeitadas não apenas como ilícitas (nisto está o pecado, pois, como vimos nas pp. 51-53, a evocação é um ato severamente interditado por Deus) ou contra a moral, mas também como heréticas ou contrárias à fé cristã. A heresia está na suposição de poder produzir efeitos não-naturais com meios naturais.
5. Os que vão de quando em quando às sessões espíritas por motivo de estudo ou divertimento ou de mera curiosidade. A suposição é que não são reencarnacionistas, nem querem praticar a evocação. Estes devem ser divididos em duas categorias: 
a) Os que fazem isso sem nenhuma licença: não são espíritas (é a suposição), mas praticam um ato ilícito e expressamente proibido pela Igreja, como vimos na página 54. Pois, pelo decreto de 24-4-1917, declarava a santa Sé ser ilícito "assistir a sessões ou manifestações espiritistas, sejam elas realizadas ou não com o auxílio de um médium, com ou sem hipnotismo, sejam quais forem estas sessões ou manifestações, mesmo que aparentemente simulem honestidade ou piedade; quer interrogando almas ou espíritos, ou ouvindo-lhes as respostas, quer assistindo a elas com o pretexto tácito ou expresso de não querer ter qualquer relação com espíritos malignos".
b) Os que fazem isso devidamente autorizados. Bons moralistas interpretam a citada decisão de 1917 de tal maneira que pode ser dispensada em casos particulares, em favor de médicos, sociólogos ou outros estudiosos que vão, não por curiosidade, não apenas para ver, mas para estudar. Excluída, pois, toda evocação e com a condição de que não ocorra perigo nenhum de perversão própria, nem de escândalo para outros, poderia o bispo permitir a assistência.
6. Os que nunca assistem às sessões, mas por qualquer motivo ajudam moral ou materialmente na construção ou manutenção de obras e empresas espíritas. São os fautores do espiritismo no Brasil. Tal cooperação consciente seria ilícita. É evidente, porém, que não devem ser tratados como espíritas ou hereges e sim como "fautores de heresia", conceito que já não ocorre na nova legislação canônica, mas que nem por isso deixa de ter seu valor. 
7. Os que assistem às sessões ou apóiam moral ou material mente o espiritismo por ignorância. No Brasil, são muitos. Devem ser tratados como ignorantes, isto é: devem ser instruídos. O presente livro foi escrito com este objetivo. Não são hereges.
8. Os que não querem praticar nem a necromancia nem a magia, não assistem às sessões espíritas, mas professam a doutrina da reencarnação, como os esoteristas, rosacruzes, teósofos e outros ocultistas. São hereges formais e como tais devem ser tratados.

2. A IGREJA PERANTE A FENOMENOLOGIA MEDIÚNICA
Convém deixar bem clara a posição oficial da Igreja perante a fenomenologia do espiritismo. Pois tem havido confusão acerca deste ponto. E para evitar possíveis falsas interpretações, adjetivarei estes fenômenos simplesmente como "mediúnicos" e não como "espíritas", visto que este último termo já especifica determinada interpretação do fenômeno. 
Creio poder compendiar nos seguintes itens a posição oficial da Igreja:
1. Por seu magistério oficial a Igreja nunca se pronunciou nem sobre a verdade histórica, nem sobre a natureza, nem sobre: a causa dos fenômenos mediúnicos ou próprios do espiritismo; por isso:
a) nenhuma das várias interpretações propostas sobre a natureza ou a causa dos fenômenos mediúnicos - nem mesmo a interpretação espírita - foi censurada, rejeitada ou condenada oficialmente pela Igreja;
b) não corresponde à verdade dizer que a Igreja endossa oficialmente a interpretação que vê nos fenômenos mediúnicos uma intervenção preternatural do demônio;
c) jamais a Igreja proibiu o estudo ou a investigação científica dos fenômenos mediúnicos.
O católico não está absolutamente proibido de estudar a metapsíquica ou a parapsicologia; pelo contrário, seria até muito de desejar que também os cientistas católicos e as universidades católicas se ocupassem mais intensa e sistematicamente com a fenomenologia mediúnica ou parapsíquica, seja para verificar sua verdade histórica, seja para investigar sua verdade filosófica ou sua causa.
2. O que a Igreja faz, fez e continuará a fazer, por ser esta sua missão específica, é recordar o mandamento divino que proíbe evocar os mortos ou outros espíritos quaisquer. Esta proibição vem de Deus, não da Igreja, que não tem nem autoridade nem competência para modificar ou revogar uma lei, determinação ou proibição divina. 
Por isso:
a) Os defensores da interpretação espírita dos fenômenos mediúnicos não podem provocar, eles mesmos, novos fenômenos desta natureza, ainda que seja para fins de estudos; a razão disso é evidente: a provocação do fenômeno implicaria necessariamente uma evocação dos espíritos, ao menos na intenção. E isso foi proibido por Deus. Para fins de estudo, o homem não pode fazer coisas ilícitas e proibidas por Deus.
b) Como toda sessão espírita tem a finalidade própria e essencial de evocar espíritos ou de provocar a obtenção de comunicações ou mensagens do além, toda e qualquer sessão espírita é um ato de formal desobediência a uma lei divina e, por isso, gravemente proibida e pecaminosa.
c) Para resolver a questão moral da prática do espiritismo, pouco importa saber se os espíritas de fato conseguem ou não evocar espíritos em suas sessões; pois se o conseguem, não há dúvida a respeito da evocação e, por conseguinte, da desobediência; se não o conseguem, é certo que eles têm ao menos a intenção, o propósito ou a vontade deliberada de evocar e, portanto, de transgredir um mandamento divino; e isso basta para um pecado formal. 
d) É, pois, a maliciosa ou pecaminosa intenção de querer evocar espíritos que toma ilícita e moralmente má a provocação de fenômenos mediúnicos em sessões espíritas, ainda que de fato sejam fenômenos puramente naturais e sem relação alguma com espíritos não-encarnados ou desencarnados.
e) Havendo, porém, certeza de que determinado fenômeno mediúnico ou metapsíquico é natural, e excluída expressamente a pecaminosa intenção de evocar qualquer espírito (bom ou mau, pouco importa), será lícito provocar o fenômeno, contanto que não seja prejudicial para a saúde. Parece, porém, que a repetição freqüente de certos fenômenos psíquicos (o transe, a escrita automática, a mesa dançante, o sonambulismo provocado etc.) pode causar perturbações psíquicas, desencadear distúrbios mentais em indivíduos predispostos, preparar o automatismo, concorrer para as alucinações, alterar as secreções internas, produzir delírios, prejudicar o sistema nervoso etc. Por isso, tais fenômenos devem ser provocados com muito critério, cautela e moderação, não em ambiente popular para distrair, mas em meios científicos para estudar.
Aqui convém recordar também a moção unânime aprovada pelo II Congresso Internacional de Ciências Psíquicas, reunido em Varsóvia, em 1922: "Considerando que os fenômenos metapsíquicos devem ser estudados por sociedades científicas e em laboratórios adequados, o Congresso emite um voto para que todas as produções 'mediúnicas', em salas de conferências, assim como as demonstrações públicas dos fenômenos ditos 'ocultos', sejam proibidas, legalmente, em todos os países, em virtude da influência nociva que podem exercer sobre o estado psíquico e nervoso das pessoas mais ou menos sensíveis que a elas assistem". 
É necessário lembrar também a advertência feita por Pio XII numa alocução à Sociedade Italiana de Anestesiologia (24-2-1957). Reconhecia o papa a liceidade da hipnose "praticada pelo médico, ao serviço de um fim clínico, observando as precauções que a ciência e a moral médicas requerem, tanto do médico que a emprega, como do paciente que a aceita". Pio XII insistia então no seguinte aviso: "Mas não queremos que se estenda, pura e simplesmente, à hipnose em geral o que dissemos da hipnose ao serviço do médico. Com efeito, esta, como objeto de investigação científica, não pode ser estudada por quem quer, mas por um sábio e dentro dos limites morais que valem para toda atividade científica. Não é este o caso de qualquer círculo de leigos ou eclesiásticos que a praticassem como coisa interessante, a título de pura experiência ou mesmo por simples passatempo".
Considerando a difusão sempre mais ampla das práticas hipnóticas (dê-se a isso o nome de "hipnotismo" ou "letargia", pouco importa), parece oportuna uma nota sobre a liceidade do hipnotismo. Do ponto de vista religioso, moral e científico devemos orientar-nos pelas seguintes diretrizes:
1. O sono hipnótico provocado é um estado perfeitamente natural e nada tem a ver com o além ou com espíritos do outro mundo. 
2. A hipnose praticada pelo médico, a serviço de um fim clínico, observando todas as precauções tanto da ciência como da ética medicais, é lícita e pode ser praticada, porque neste caso a supressão da consciência é permitida pela moral natural e compatível com o espírito do evangelho.
3. É permitida também a hipnose praticada por pessoas competentes para fins verdadeiramente científicos.
4. Não se pode permitir a hipnose, nem mesmo para fins clínicos, quando praticada por pessoa incompetente, sem o suficiente preparo técnico e o adequado conhecimento científico. 
5. Não é permitido praticar a hipnose a título de pura experiência e como passatempo, ainda que o hipnotizador seja preparado e competente.
6. É ilícito qualquer espetáculo público de hipnotismo sobre grupos de pessoas. Baseia-se esta última norma sobre as seguintes razões:
a) o operador não pode controlar rigorosamente a ação e a reação de cada indivíduo, o que é absolutamente indispensável, já que está atuando sobre a parte mais íntima e sagrada da personalidade humana;
b) em algumas pessoas a hipnose, quando feita para divertir ou brincar, pode causar profundas perturbações e transtornos psíquicos;
c) nas demonstrações hipnóticas de palco ou televisão foram constatados, de maneira inequívoca, fenômenos de despersonalização, isto é, sugestão de que o paciente tinha outra identidade, Hider, por exemplo, fenômeno este totalmente contra-indicado do ponto de vista psiquiátrico;
d) em espetáculo de hipnose coletiva nem todos caem na mesma profundidade do sono provocado. Verificam-se também reações diferentes às sugestões dadas. Daí se infere que a natureza da sugestão deve ajustar-se ao grau de sono obtido, coisa a que os hipnotizadores de palco não atendem nem podem atender. Uns entram facilmente em determinado sono, outros com muita dificuldade, outros ainda parecem negar-se a aceitar estados mais profundos. Uns reagem prontamente e bem-dispostos, outros penosamente, dando demonstrações de desagrado. 
Uns suam, outros ficam com as extremidades frias. Alguns tremem e chegam a contorcer-se, outros permanecem tranqüilos e parecem descansar em sono agradável. Uns acordam sorridentes e satisfeitos, outros continuam sonolentos, com tonturas e dores. De tudo isso se conclui que cada pessoa deve ser tratada individualmente, com muito cuidado e competência e que a hipnose coletiva ou de grupos é perigosa e deve ser interditada; 
e) sobretudo as crianças e certas pessoas sugestionáveis correm perigo, notadamente de ordem psicológica, mesmo quando apenas assistem a certos espetáculos de hipnose, encenadas para impressionar.
Condenam-se, por isso, sem reserva, como desnecessários e perigosos todos e quaisquer espetáculos ou demonstrações de hipnotismo de grupos ou de palco.

3. CARIDADE E FÉ
Diante da severidade da Igreja em preservar a pureza da doutrina cristã e punir os delitos contra a fé, surge espontaneamente a pergunta: Por que tanto rigor? Não basta a caridade? 
Para conservarem as aparências cristãs e se acobertarem sob o manto cristão, os espíritas repetem as palavras de Jesus sobre a caridade e proclamam o princípio: "Fora da caridade não há salvação". É sem dúvida certo: sem a caridade cristã, não há salvação; e quem não tiver a caridade, não é verdadeiro discípulo de Jesus Cristo. E a Igreja seguramente não rejeita o espiritismo por causa deste princípio. A Igreja católica tem sido sempre e ainda hoje continua sendo a pregoeira máxima da caridade cristã. É preciso ter os olhos cegos pelo fanatismo para não vê-lo. Quem poderá contar as instituições de caridade mantidas, dirigidas ou inspiradas pela Igreja em todo o mundo? Quem poderá contar os inúmeros católicos que se dedicam exclusiva e totalmente à caridade? Os maiores heróis da caridade, mesmo aqueles apregoados pelos espíritas, como um são Francisco de Assis ou um santo Antônio de Lisboa (ou Pádua), eram santos catolicíssimos. O erro dos espíritas não consiste na pregação da caridade (nisso, pelo
contrário, eles são dignos de aplauso e louvor); seu erro está em dizer que basta a caridade somente. Jesus Cristo nunca ensinou isso. Pois Jesus, o evangelista da caridade, foi também o evangelista da fé. Sua doutrina não é apenas moral. São Marcos nos refere as últimas e solenes palavras de Jesus, dirigidas aos apóstolos pouco antes de sua ascensão ao céu: "Ide por todo o mundo, proclamai o evangelho a toda criatura. Aquele que crer e for batizado será salvo; o que não crer será condenado" (Mc 16,15-16). Quem não crer será condenado! São também palavras de Jesus. E em são Mateus damos com estas outras palavras de Jesus, não menos solenes e formais: "Toda a autoridade sobre o céu e sobre a terra me foi entregue. Ide, portanto, e fazei que todas as nações se tomem discípulos, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo e ensinando-as a observar tudo quanto vos ordenei. E eis que eu estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos" (Mt 28,18-20).
Instruídos por Cristo e fortalecidos pelo Espírito Santo, os apóstolos saíram a pregar.
Advertidos por Jesus, eles sabiam que o inimigo tudo faria para dispersar a grei que o Senhor queria una; alertados por Cristo, previam que os lobos viriam vestidos em pele de ovelha e que o anjo das trevas se apresentaria lisonjeiro como anjo da luz; prevenidos pelo divino mestre, sabiam que o "homem inimigo" aproveitaria as sombras da noite e a desprevenção dos homens que dormem para espargir o erro e a discórdia. Por isso conservaram-se vigilantes e enérgicos. E quando, por exemplo, na novel comunidade dos gálatas se infiltrou o erro dos judaizantes, são Paulo não hesitou: "Ainda que nós mesmos ou um anjo do céu vos anunciar um evangelho diferente do que vos anunciamos, seja anátema. Como já vo-lo disse, volto a dizê-lo agora: se alguém vos anunciar um evangelho diferente do que recebestes, seja anátema" (Gl 1,8-9). E ao despedir-se da Ásia menor, em Mileto, o que mais pesava em sua alma era a previsão dos
primeiros vestígios do gnosticismo, de um sincretismo de seitas judaístas, de filosofias helenistas e de religiões de mistérios que rebaixavam Jesus Cristo a um dos espíritos cujo culto propagavam, e implora então aos presbíteros responsáveis: "Sede solícitos por vós mesmos e por todo rebanho, do qual o Espírito Santo vos estabeleceu guias para apascentar a Igreja de Deus, que ele adquiriu para si pelo sangue de seu próprio Filho. Eu sei que, depois de minha partida, introduzir-se-ão entre vós lobos cruéis que não pouparão o rebanho, e que no meio de vós surgirão homens que farão discursos perversos com a finalidade de arrastar discípulos atrás de si. Por isso sede vigilantes, lembrando-vos de que durante três anos, dia e noite, não cessei de exortar com lágrimas a cada um de vós" (At 20,28-31). Igual solicitude pela pureza da fé encontramos nas cartas aos efésios, aos colossenses e, sobretudo, nas cartas pastorais a Tito e Timóteo. Assim escreve a seu colaborador Timóteo: "Eu te conjuro, diante de Deus e de Cristo Jesus, que há de vir julgar os vivos e os mortos, pela sua aparição e por seu reino: proclama a palavra, insiste, no tempo oportuno e no importuno, refuta, ameaça, exorta com toda paciência e doutrina. Pois virá um tempo em que alguns não suportarão a sã doutrina; pelo contrário, segundo os seus próprios desejos, como que sentindo comichão nos ouvidos, se rodearão de mestres. Desviarão os seus ouvidos da verdade, orientando-os para as fábulas" (2Tm 4,1-4). E a Tito recomenda: "Depois de uma primeira e de uma segunda admoestação, nada mais tens a fazer com um homem faccioso, pois é sabido que um homem assim se perverteu e se entregou ao pecado, condenando-se a si mesmo" (Tt 3,10-11). O mesmo modo inexorável de tratar os
hereges nos é recomendado por são Judas Tadeu e também pelo "discípulo do amor", são João,
que chega até a proibir qualquer relação com eles: "Não o recebais em vossa casa, nem o saudeis. Aquele que o saúda participa de suas obras más" (2Jo 10).
Foi neste mesmo espírito de apostólico zelo que nossos bispos denunciaram a heresia do espiritismo, para conservar no nosso povo não apenas a caridade, que é necessária e deve incendiar todos os corações cristãos, mas também a fé, ensinando-os a observar tudo que Cristo ensinou e mandou. Pois "quem não crer será condenado" (Mc 16,16) e "sem fé é impossível agradar a Deus" (Hb 11,6).
Sejamos, pois, integralmente cristãos. Sigamos a Cristo, evangelista da caridade; mas sigamos também a Cristo, evangelista da fé. Caridade ardente e fé inabalável: eis as duas asas com que nos alçaremos ao céu, "

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Fonte:
Espiritismo – orientação para católicos
Frei Boaventura Kloppenburg

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