COMO EVITAR O PURGATÓRIO?
Pode-se evitar o purgatório?
Há em geral
entre muitos a idéia de que é impossível entrar no céu logo depois da morte,
principalmente quando se pensa na Justiça de Deus, na Santidade Divina e a
miséria humana. O purgatório não é sempre inevitável. Pode-se evitar o
purgatório e é vontade de Deus que façamos tudo neste mundo para merecer logo o
céu. É impossível! É dificílimo!... Sim, difícil, não há dúvida, mas
impossível, nunca! Não digamos como tantos: contanto que eu arranje um lugar no
purgatório... Por humildade, e em verdade, podemos falar assim, mas por
covardia e para afrouxarmos no trabalho da nossa perfeição, nunca o podemos
dizer, nem proceder assim. Havemos de fazer tudo para evitar o purgatório. “Aqui,
disse Santa Catarina de Genova, pagamos com um, a dívida de mil, e na outra
vida precisamos de mil para pagar um... Está em nossas mãos ganhar muito e
preparar a entrada do céu logo depois da morte”.
Santa
Teresa viu almas entrarem no céu sem terem passado pelo purgatório. Procurar
evitar o purgatório é o melhor meio de se livrar dele. Evitemos o pecado
venial, sejamos fiéis ao nosso dever, tenhamos uma grande pureza de intenção em
nossos atos. Façamos muitas obras de caridade, fujamos de toda vaidade e
hipocrisia em nossas ações, sejamos sinceros, humildes, simples, tenhamos
paciência em nossos sofrimentos, sejamos resignados à vontade de Deus em todas
as coisas. Quantos meios ao nosso alcance para evitarmos o purgatório! Zelemos
a pureza de consciência e a pureza de intenção. Não é impossível escapar do
purgatório. Está em nossas mãos. Uma alma fervorosa se abrasa neste mundo nas
chamas do Divino Amor que purifica cada dia mais e se santifica de tal modo,
que logo se lhes abram as portas do céu.
Fazer
esforços para evitar o purgatório não é, como dizem alguns, uma covardia. É
glorificar a Deus, é estimular a nossa perfeição, é corresponder à graça com
generosidade, enfim, é um dos meios mais poderosos e eficazes de santificação.
Temos muita miséria e fraqueza. Vivamos num estado de compunção, contritos e
humildes. Não tenhamos a presunção que perde tantas almas e as leva a esperar
o céu com tão pouco sacrifício!
Enquanto
estamos neste mundo, somos os milionários da graça e dos tesouros da Redenção.
Somos mais felizes do que os Santos do céu e as almas do purgatório. Eles não
podem mais merecer, nem trabalhar para a salvação e para a glória do céu, como
nós agora. Então, por que não aproveitarmos estas riquezas de valor infinito?
Um dos maiores tormentos das pobres almas é o remorso. Que verme roedor!
Pensarem elas que poderiam ter sofrido tão pouco e trabalhado um pouco mais, e
já estariam no céu e teriam salvo tantas almas e feito tanto bem quando
estavam neste mundo, e desperdiçaram os tesouros do Sangue Precioso de Jesus e
agora padecem tanto! Poderiam ter evitado o purgatório... E nós?
Meios de evitar o purgatório
O primeiro
e o único verdadeiro é evitar o pecado venial e toda imperfeição, exceto
aquelas quase impossíveis à fragilidade humana. Sem privilégio especial não é
possível ao homem evitar todas as faltas, diz o Concilio de Trento. Pelo
menos, lutemos e tenhamos boa vontade. Tenhamos horror ao pecado, mesmo venial.
Demos muita importância ao que é de perfeição, sobretudo os Religiosos à
observância da Santa Regra. Há outros meios de evitar o purgatório. Entre
eles, os meios sacramentais — o Batismo. Uma alma recém batizada que morre está
livre de toda pena, tem o céu imediatamente. Felizes as criancinhas inocentes
e felizes, os que morreram com a inocência batismal!
A confissão
frequente, bem praticada, com sincero arrependimento, com emenda de vida cada
dia mais, é um meio poderoso de vigilância, de combate às faltas e
imperfeições. Uma confissão semanal ou de quinze em quinze dias para lucrar as
indulgências, e confissão sem rotina, bem preparada, bem contrita, como
purifica a alma e vai fazendo seu purgatório nesta vida! Como é poderosa a
absolvição que nos dá o sacerdote; e a penitência sacramental, embora tão pequena,
tem muito valor para a remissão da pena temporal.
E a
Eucaristia? Não apaga o pecado venial e nos purifica cada vez mais, dando-nos
força para a luta? Ó, as almas eucarísticas, unidas ao Senhor na intimidade do
seu Amor, abrasadas nas chamas deste Amor, podem temer as chamas do
purgatório? Purifiquem-se muito bem para a Comunhão aqui na terra, que estarão
se purificando para a Visão eterna do céu logo após a morte. Uma alma
verdadeiramente eucarística não teme o purgatório. Depois, temos a riqueza da
Extrema Unção e da Bênção apostólica na hora da morte. Falaremos depois destes
meios, chaves do céu e libertadores do purgatório. E demais, os religiosos, por
exemplo, têm os méritos da vida comum, as indulgências da Ordem ou Instituto
religioso, as penitências, as meditações, as boas leituras, enfim a multidão
dos recursos espirituais que bem aproveitados, escrupulosamente, cada dia, sem
ser mister que se entreguem a coisas extraordinárias e difíceis e até
impossíveis, quantos meios para evitarem o purgatório com a simples fidelidade
à Regra! A perfeita observância, como diz São Bernardo, pode levar da cela
para o céu. “De cella ad coelum”.
Evitarão o
purgatório as almas simples e inocentes, aqueles pobrezinhos ignorantes que
sempre viveram numa profunda humildade a servirem a Deus na simplicidade do seu
coração. Quantos destes pequeninos amados de Nosso Senhor após os sofrimentos
desta vida não passam diretamente para o céu!
Enfim, é o
segredo de Deus, o mistério insondável. E a caridade? Não nos foi prometido cem
por um e o reino do céu pelas boas obras de misericórdia? Quem pode duvidar que
uma alma caridosa que passou a vida a fazer o bem aos pobres e desgraçados,
não tenha o céu logo após a morte? Ó, sim, podemos evitar o purgatório, e direi
mais, devemos evitar o purgatório. Esta é a vontade de Deus!
A Extrema Unção e indulgência apostólica
A Extrema
Unção tem o poder de nos abrir logo as portas do céu. É a opinião do angélico
Santo Tomás: “A Extrema Unção acaba a cura espiritual do homem e faz
desaparecer de sua alma tudo quanto poderia impedi-lo de entrar na glória e
consuma sua preparação para a vida eterna”.
Supõe
naturalmente que o enfermo a receba com as devidas disposições. A Extrema Unção
é como que o complemento da penitência. Esta redime os pecados e aquela faz
desaparecer os restos do pecado. Um dos efeitos da Extrema Unção é fortificar a
alma contra o temor exagerado da morte e ajudá-la a se conformar inteiramente
à vontade de Deus. Só este ato de conformidade, diz Santo Afonso, pode levar
uma alma logo para o céu sem passar pelo purgatório, porque é um ato de
caridade de grande valor. Enfim, que tesouro desconhecido é a Extrema Unção, e
tantos deixam de a receber na hora extrema porque os parentes e amigos, com
receio de assustar o enfermo, o privam deste recurso! Na sua Teologia moral,
Santo Afonso conta esta visão: Percebeu no purgatório a alma de um homem seu conhecido
e foi-lhe revelado que este homem não teria morrido da doença que o levou a
sepultura, se tivesse recebido a Extrema Unção. A virtude do Sacramento o teria
curado e teria se livrado de um purgatório tão doloroso e menos longo do que o
que estava padecendo [1].
Por que
então deixar os enfermos sem a Extrema Unção, sob o pretexto de que é o
sacramento que mata, apressa a morte e assusta o enfermo? Um dos efeitos do
Sacramento é curar também o corpo, e o maior de todos, curar a alma de todos os
males e consequências do pecado, e abrir-lhes as portas do céu. A Igreja, nossa
Mãe, tem outro tesouro à nossa disposição na hora derradeira: é a Indulgência
plenária ou apostólica. Esta indulgência nos pode abrir logo o céu. Vejam as
preces do sacerdote ao dá-la aos enfermos: “Nosso Senhor Jesus Cristo, Filho
de Deus Vivo, que deu ao Bem-aventurado Apóstolo Pedro o poder de ligar e
desligar, pela sua piíssima misericórdia, receba a tua confissão e te restitua
a estola primeira que recebeste no Batismo. E eu, pela faculdade que me foi
dada pela Sé Apostólica te concedo a indulgência plenária e a remissão de todos
os pecados em nome do Padre e do Filho e do Espírito Santo”.
Que beleza!
A inocência do Batismo restituída a um pecador na hora da morte! Não é a porta
do céu? E o sacerdote acrescenta, para confirmar a absolvição: “Pela
Sacrossanta Humanidade e pelos mistérios da reparação humana, o Deus
Onipotente te perdoe todas as penas desta e da futura vida, te abra as portas
do paraíso e te leve à felicidade eterna”.
Haverá
maior riqueza para um cristão? Até as penas da outra vida, isto é, as do
purgatório estão remidas pela indulgência plenária. Meditemos bem as orações e
o rito da Extrema Unção, procuremos nos preparar sempre para recebermos na hora
derradeira com as devidas disposições a Indulgência plenária ou Apostólica.
Eis aí
quantos meios de evitar o purgatório à nossa disposição! Não é pois verdade que
podemos nos livrar do purgatório?
Exemplo
As Irmãs
auxiliadoras do purgatório
Em 21 de
Novembro de 1855 uma jovem piedosa lia num opúsculo, “O Mês do Purgatório”,
por um autor desconhecido, esta página profética e suplicante:
“Ó Espírito
Santo, vós suscitastes, em épocas diferentes, ordens religiosas de toda
espécie para todas as necessidades da Igreja militante. Ó Pai das Luzes, cheios
de compaixão e de zelo pelos mortos, nós vos suplicamos, suscitai também em
favor da Igreja padecente uma nova ordem cujo fim principal seja se ocupar dia
e noite no alívio e na libertação das almas do purgatório...”.
Quem lia
isto, comovida e inspirada, era a senhorita Eugênia Maria José Desmet. Sempre
foi uma alma piedosa e desde pequenina teve uma devoção ardente pelas almas do
purgatório e uma inclinação pelos pobres e miseráveis, aos quais procurava
sempre amparar caridosamente. Ao ter a inspiração tão forte da fundação de uma
obra para socorro das almas do purgatório, não pode mais ter sossego. Era uma
alma sincera, um espírito muito equilibrado e nada sujeito a fantasias. Neste
mesmo dia 1.º de Novembro, ao sair da igreja, a senhorita Desmet encontra uma
amiga que lhe fala na necessidade de uma associação em favor das almas do
purgatório. Era uma coincidência muito estranha! A piedosa jovem sabia que era
necessário agir, mas tinha medo de ilusões, e pediu a Nosso Senhor alguns
sinais da sua Santa Vontade. Queria cinco graças: a bênção do Papa para a obra
— a aprovação de diversos Bispos — a extensão rápida da Associação — um certo
número de almas piedosas que se destinassem a este apostolado — e um padre que
tivesse a mesma idéia.
Em menos de
dois anos alcançou tudo quanto desejava. O projeto foi apresentado a Pio IX,
que o aprovou de todo coração. Diversos senhores Bispos, e entre eles o
Arcebispo de Paris, deram a sua bênção e aprovação rapidamente. O padre que
tivesse a mesma idéia, seria o Santo Cura d’Ars. A senhorita Desmet nunca viu
nem escreveu ao Cura d’Ars, mas através do Pe. Tocanier coadjutor do Santo, foi
este consultado. São João Maria Vianney disse: “Diga a ela, referia-se a M.
Desmet, diga a ela que estabeleça uma congregação pelas almas do purgatório
quando ela quiser”.
Não ficou
satisfeita ainda a senhorita. Queria que o Santo Cura d’Ars meditasse e rezasse
para saber se era da vontade de Deus o projeto. Assim o fez. Num dia de
finados, o Santo passou de joelhos longa hora, rezou muito e levantando-se com
os olhos banhados em lágrimas, disse ao Pe. Tocanier: “A obra é inspirada por
Deus, foi Deus quem inspirou uma tal dedicação. Duas coisas pode ter certeza:
que aprovo a vocação dessa senhorita à vida religiosa e a fundação desta
congregação, que há de se estender rapidamente pela Igreja; está aí uma obra
que Nosso Senhor pede há muito tempo”.
A respeito
do noviciado, disse o Cura d’Ars: “Poucas para começar, mas bem escolhidas e de
boa semente...”.
O Pe.
Olivant poderia mais tarde dizer das fundadoras: é um punhado de almas de
elite.
Qual o fim
do Instituto nas obras? Foi ainda o Cura d’Ars quem o inspirou: trabalhar pelas
almas do purgatório, dedicando-se às obras de caridade. “Realizareis, disse ele
às fundadoras, realizareis a plenitude do espírito de Jesus Cristo, aliviando
ao mesmo tempo os seus membros sofredores na terra e no purgatório”.
Em 19 de
Janeiro de 1856, Eugênia Smet chegou a Paris e se retirou com algumas companheiras,
suscitadas por Deus, numa residência modesta . Três dias depois foi procurar o
Arcebispo Mons. Sibour, que a recebeu com muito carinho e prometeu fazer tudo
pela obra. Em Junho do mesmo ano estava a Congregação estabelecida. Vieram
muitas provações.
Em pouco
tempo a morte do Arcebispo e do Santo Cura d’Ars. Não obstante, a obra
prosperou. Em 27 de Fevereiro de 1871, Pio IX deu o Breve de aprovação e Leão
XIII, em 1878, aprovou as Constituições. As Irmãzinhas do Purgatório abriram
casas em outras nações e foram até para a China realizar o seu programa:
glorificar a Deus socorrendo as almas do purgatório, aliviando todas as
misérias humanas.
Madre Maria da Providência foi o nome da
senhorita Smet em religião.
Foi
admirável esta santa criatura! Passou dolorosas provações, mas tudo venceu
heroicamente. O Cura d’Ars lhe havia profetizado muitas cruzes: “Vossas cruzes
são flores que hão de dar muitos frutos. Só vós haveis de saber um dia quanto
sofrimento vos há de custar para firmar vossa obra. Porém se Deus está
convosco, quem será contra vós?”. A profecia se realizou. “A Igreja padecente
deve ter mártires neste mundo, dizia Madre Maria da Providência”. Dizia ela
também, gemendo de dor na doença: “Amar sofrendo e sofrer amando para vos dar
almas, ó meu Jesus!”. É preciso sofrer para pagar tantas graças!
No
Instituto das Irmãzinhas do Purgatório duas devoções se cultivam com amor: a do
Sagrado Coração de Jesus e da Providência Divina. A piedade e devoção a Maria
Santíssima é tudo na obra sob a invocação de Nossa Senhora da Divina
Providência. Cada dia e a cada hora hão de repetir as Irmãs: “Meu Deus, nós vos
oferecemos pelas almas do purgatório todos os atos de amor pelos quais o
Sagrado Coração de Jesus vos glorificou nesta mesma hora, quando estava na
terra”.
Não é uma bela invocação que podemos também
adotar?
Rezar,
sofrer, trabalhar! Era o lema da Madre Maria da Providência, fundadora das
Irmãzinhas do Purgatório. Seja o nosso lema: rezar, sofrer e trabalhar pelas
almas do purgatório! — (Vie de la R, M. Marie de la Providence).
[1] Cit.
Rousic — “Le Purgatoire”.
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