Que são as indulgências?
Entende-se por indulgência a
remissão ou perdão das penas temporais devidas a Deus pelos pecados já
perdoados em quanto à culpa, remissão concedida pela Igreja pela autoridade
eclesiástica fora do Sacramento da Penitência.
As penas eternas são perdoadas
ao pecador que faz penitência, mas nem sempre as penas temporais. Há necessidade
de fazer penitência e sofrer um pouco em reparação dos pecados cometidos. Daí
a pena temporal pelos pecados. Ora, a Igreja que recebeu o poder de perdoar a
pena eterna, muito mais o tem para remir da pena temporal. “Tudo o que ligares
na terra, será ligado no céu, e tudo o que desligares na terra, será desligado
no céu”, disse Jesus a Pedro. Na Igreja primitiva os fiéis recebiam grandes
penitências pelos seus pecados acusados. Havia penitências públicas bem duras
e longas. Jejuns a pão e água por vários dias na semana e por alguns anos. Em
crimes mais graves como o homicídio, por exemplo, o penitente fazia doze e
mais anos de penitências públicas, algumas das quais bem humilhantes. Nas
faltas mais leves, o jejum de quarenta dias (uma quarentena). Depois, com o
tempo, atendendo à fraqueza humana e aos tempos, a Igreja permitiu que as
penitências públicas fossem substituídas por esmolas, cruzadas, peregrinações
e outras obras que serviam para expiação dos pecados. As penas canônicas
foram substituídas pelas indulgências concedidas aos que fizessem algumas boas
obras ou atos de piedade. Quando eram perdoadas todas as penitências, era a
indulgência plenária, e quando uma parte, a indulgência parcial. Assim, quando
se diz uma indulgência plenária quer dizer que o fiel lucra um perdão de todas
as penitências que deveria fazer pelos seus pecados e os castigos que deveriam
merecer suas faltas com penas temporais. Uma indulgência de cem dias, por
exemplo, se entende que deveria fazer cem dias de penitências por seus pecados
e com uma oração recitada piedosamente ou outra boa obra pode satisfazer esta
dívida que tem para com Deus.
A indulgência é uma espécie de
absolvição das penas temporais, é uma anistia do Soberano Juiz de nossas almas.
Não se poderia dizer propriamente que a indulgência é a remissão das penas
canônicas, mas uma remissão verdadeira da pena com que Deus castiga o pecado.
Não dispensa a penitência e nem a confissão humilde de nossos pecados.
Há muita noção errada sobre as
indulgências. Assim, muita gente pensa que ganhar indulgências, por exemplo, de
trezentos dias é perdoar trezentos dias de purgatório, ou uma indulgência
plenária importa numa remissão total das chamas expiadoras. Também não
significa que ao ganhar duzentos ou quinhentos dias de indulgências pelas almas
do purgatório lhes aliviamos outros tantos dias de sofrimento. Esta medida do
tempo da expiação é o segredo de Deus e depende muito do fervor e das
disposições de quem lucra as indulgências.
A Igreja, pelos méritos
superabundantes de Jesus Cristo e os méritos de Maria e dos Santos, e pelo
tesouro das boas obras dos justos, aplica para o bem dos fiéis neste mundo e
para alivio das almas do purgatório as indulgências.
Vantagens das indulgências
Todo pecado trás como
consequência duas coisas: a culpa e a pena. Pela verdadeira contrição e pelo
sacramento da Penitência, ficam perdoadas as culpas e a pena eterna. Deus nos
perdoa e nos livra da condenação eterna. Todavia, fica-nos o dever da
penitência e da reparação do mal que cometemos. Fica uma dívida que devemos
pagar à Justiça de Deus, neste mundo ou no purgatório, se a dor destes pecados
não foi tão grande que tudo tivesse remido. Pelas indulgências podemos diminuir
e até pagar toda esta pena temporal. Tiramos do tesouro da Igreja, formado
pelo Sangue de Cristo, os méritos, e de Maria e dos Justos, o que precisamos
para o pagamento de nossas enormes dívidas. É o que demonstram os teólogos.
A Igreja, todavia, nunca
ensinou que as indulgências nos dispensassem de fazer penitência e levar a
cruz da mortificação. Com umas poucas orações e boas obras, quantas graças não
podemos obter para nós e para os fiéis defuntos?
Três coisas são necessárias
para se ganharem indulgências: o estado de graça — em estado de pecado grave
não se lucram indulgências. A intenção de lucrar as mesmas. Para isto basta a
intenção virtual e podemos já fazer pela manhã a intenção de lucrarmos todas
as indulgências anexas às orações e boas obras que praticarmos naquele dia. E,
finalmente, é mister praticar as obras prescritas, por exemplo, rezar tais e
tais orações, visitas às igrejas, etc. Ora, já pelas suas condições vemos que
as indulgências são de grande vantagem para quem as deseja lucrar, pois
obriga-o a levar uma vida de estado de graça e procurar se aperfeiçoar sempre
para poder lucrá-las com mais segurança. O estímulo das indulgências leva os
fiéis a muitas obras meritórias. Para lucrar a indulgência plenária é mister a
confissão e a Santa Comunhão e orar nas intenções do Soberano Pontífice, além
das orações ou obras prescritas para lucrá-las. Não é um estímulo para a
prática dos Sacramentos, e para que tenhamos sempre a consciência limpa? Não
percamos o tesouro das indulgências que é riquíssimo na Santa Igreja. A
condição da confissão e comunhão para lucrar a indulgência plenária se
satisfaz com a confissão semanal ou de quinze em quinze dias, excetuadas as
indulgências do Jubileu do Ano Santo, que exigem uma confissão e comunhão
especiais para lucrá-las.
O zelo pelas indulgências leva
o cristão a ter sempre seu coração livre do pecado e fazer penitência, porque
bem sabe, que quanto mais pura for nossa alma diante de Deus, tanto mais
méritos pode obter e salvar muitas almas do purgatório.
E demais, quantas penitências
não deveríamos fazer por tantos e tão grandes pecados que cometemos em nossa
vida! Aproveitemos o tesouro das indulgências que irão descontando nossas
enormes dívidas, e além do mais, socorrendo tantas pobres almas sofredoras no
purgatório. Seremos muito bem recompensados por este grande ato de caridade.
Quantas vantagens, pois, nas indulgências! E como se perdem e se desprezam
tamanhos tesouros!
Indulgências pelos fiéis defuntos
Podemos lucrar indulgências
pelos nossos mortos? — Diz Santo Tomás de Aquino com a sua autoridade de
Doutor da Igreja: “Não há razão alguma para que a Igreja, que pode transferir
os méritos dos vivos, não possa também transferi-los aos mortos, pois Santo
Agostinho ensina que as almas dos que morreram na amizade de Deus não são
separadas da Igreja”.
Muito antes de Santo Tomás o
Concilio de Arraz ensinou esta doutrina: “É preciso não acreditar que a
penitência aproveita só aos vivos e não aos defuntos”. Muitos doutores da
Igreja, como São Gregório Magno nos seus Diálogos, e outros mais antigos,
ensinam esta consoladora doutrina que vem dos primeiros séculos da Igreja.
As indulgências podem, pois,
servir aos vivos e aos mortos. Em linguagem teológica podem ser aplicadas aos
vivos e aos defuntos. Santa Madalena de Pazzis aproveitava quantas indulgências
podia lucrar pelos defuntos. Deus a recompensou com uma miraculosa visão. Uma
das suas irmãs, muito virtuosa, acabava de falecer e fôra condenada ao
purgatório. Santa Madalena se pôs a rezar e ganhar indulgências pela defunta.
Havia quinze horas que a morta havia comparecido diante de Deus, quando
apareceu à Santa e lhe disse, toda bela e resplandecente: Adeus, ó minha irmã
querida!
“Ó alma feliz, exclama Santa
Madalena, como é grande a vossa glória! Como foi curto vosso purgatório!
Vossos restos mortais ainda não foram sepultados e já entrastes na eterna
pátria!”.
Nosso Senhor revelou à grande
Santa que esta alma deveria ter um longo purgatório, mas se livrou em tão pouco
tempo pelas indulgências que ela havia lucrado pela defunta.
Conta-se na Vida de Santa
Teresa, a Matriarca do Carmelo, um fato consolador. Uma Carmelita de uma vida
muito simples e que em nada se distinguia das outras, veio a falecer, e a Santa
a viu subir ao céu com grande glória pouco tempo depois da morte, de sorte que
teria tido talvez um brevíssimo purgatório. E como Teresa revelasse grande
surpresa com isto, Nosso Senhor lhe disse que aquela religiosa sempre teve
grande respeito pelas indulgências da Santa Igreja e durante toda vida sempre
se esforçou por ganhar o maior número que lhe foi passível. E isto fez com que
tivesse pago a maior parte das suas dívidas para com a Divina Justiça.
Aliviemos os sofrimentos de
nossos mortos queridos, procurando ganhar por eles muitas e numerosas
indulgências. Grande parte deste tesouro é aplicável às almas. Deus aceita
sempre esta satisfação dos vivos pelos mortos, diz o grande teólogo Suarez.
Talvez haja para nós dificuldades e obstáculos para lucrarmos indulgências, porém
Deus sempre as aceita pelas almas do purgatório.
O Santo Rosário, a Via Sacra,
que riqueza de indulgências para os mortos nos oferecem estas duas práticas
piedosas! Recitemos jaculatórias indulgenciadas. É tão fácil repeti-las em
toda parte e a toda hora! Duplo proveito: nossa união com Deus e alívio das
pobres almas. Vamos, pois, cheios de generosidade aproveitar o tesouro das
indulgências em favor do purgatório!
Exemplo
O que vale um Requiem
Autores antigos como Dorlandus,
na Crônica Cartusiana, e Teófilo Regnaud, em Heter Spirituale — Pars II, Sect.
II — narram este fato que por aí às vezes tem sofrido variantes acrescentadas
pelo povo:
Um rico senhor, de uma fortuna
bem considerável, deixou uma herança para o filho, único herdeiro. Este, muito
piedoso, lembrou-se logo da alma do pai e quis sufragá-la generosamente. Logo
após o enterro do pai, vai a um mosteiro e oferece uma grande soma ao Prior,
rogando muitas orações pelo morto querido. No mesmo instante, os monges se
reuniram e o Prior lhes disse: “Meus irmãos, acaba do falecer e foi hoje
sepultado um grande benfeitor deste convento. Oremos por sua alma”.
Imediatamente os monges entoaram um “Requiescat in pace”. E o Superior
responde: Amen. Logo depois se retiram todos do coro.
O moço, filho do benfeitor,
admirou-se de tão pouca oração, após ter oferecido tão grande soma. “Tão pouco,
diz ele ao Prior, por tão generosa oferta?” O Prior, inspirado por Deus, quis
dar uma lição ao jovem e mostrar-lhe o valor da oração. Mandou que os
religiosos escrevessem todos num papel estas palavras que rezaram: Requiescat
in pace! E depois lho trouxessem. Mandou chamar ao jovem e pôs os papeis num
prato de balança, e noutro prato a soma de dinheiro em moedas pesadas,
oferecidas pelo benfeitor. Ó prodígio! No mesmo instante o prato da balança
pendeu para o lado do papel, com admiração geral. Diante disto, reconheceram
todos o quanto vale um Requiescat in pace pelos defuntos. O moço se retirou
contente e convencido de que não se podem comparar os bens materiais com os
espirituais.
A Bem-aventurada Maria de Quito
foi arrebatada em êxtase e viu uma mesa cheia de pedrarias e jóias e moedas de
ouro. Uma voz lhe dizia: Estas são as riquezas oferecidas a todos. Cada um pode
delas se servir como queira. Era uma figura das riquezas espirituais das
indulgências que todos podemos juntar e aproveitá-las para nossa alma e
principalmente em favor das pobres almas do purgatório.
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